Apesar do avanço global da publicidade de varejo (Retail Media), o mercado brasileiro — especialmente entre varejistas nacionais e regionais — ainda dá passos tímidos rumo à maturidade em gestão e governança. Embora o conceito já esteja presente em grandes redes, são inúmeros os entraves que limitam seu potencial. Campanhas fragmentadas, foco excessivo em verbas de trade marketing, baixa integração omnichannel e cultura organizacional ainda pouco orientada ao shopper são alguns dos fatores que precisam ser enfrentados com urgência.
A lentidão da expansão: causas estruturais e culturais
Entre as principais causas para a expansão lenta do Retail Media no Brasil, destacam-se:
a) Foco restrito em verbas de trade marketing: Muitos varejistas continuam operando com uma visão limitada, concentrando seus esforços na captação de verbas tradicionais de trade marketing. Esse modelo, focado unicamente em sell-out e visibilidade de produto, não considera o shopper em sua jornada completa, tampouco aproveita o potencial de monetização de dados e insights comportamentais.
b) Campanhas fragmentadas e ausência de visão full funnel: Ainda é comum encontrar campanhas isoladas, com baixa conexão entre branding e performance. Sem uma arquitetura de mídia orientada ao funil completo — da descoberta à conversão —, as campanhas não geram valor sustentável para os anunciantes nem constroem relações de longo prazo com os consumidores.
c) Falta de política comercial robusta: A ausência de uma política de monetização estruturada impede o varejista de precificar corretamente seus ativos de mídia e atrair investimentos recorrentes. Sem diretrizes claras de pacotes, formatos, KPIs e integração com dados, o modelo fica preso à informalidade.
d) Baixa digitalização operacional: Muitos varejistas ainda gerenciam campanhas em planilhas, sem uso de adservers, plataformas DMP/CDP ou integração com o CRM. Essa limitação operacional compromete a escalabilidade, a mensuração e a personalização das campanhas.
e) Falta de integração omnichannel: Poucos varejistas conseguem operar de forma integrada os canais onsite, offsite e instore. Isso compromete a jornada omnichannel do shopper e limita o potencial das marcas de impactarem o consumidor com relevância em múltiplos pontos de contato.
f) Venda identificada ainda insuficiente: Muitos dos grandes varejistas sequer atingiram 50% de venda identificada, dificultando a criação de clusters consistentes para personalização e segmentação de campanhas. A base de dados ainda não é robusta o suficiente para alimentar uma estratégia de mídia inteligente e baseada em comportamento.

Marcas CPG ainda não amadureceram em Retail Media
Mais de 300 marcas CPG (Consumer Packaged Goods) ainda não incorporaram o Retail Media como um pilar estratégico com ausência de lideranças capacitadas em mídia e shopper marketing; visão full funnel de jornada; estrutura analítica para mensuração; e integração com JBPs (Joint Business Plans), faz com que apenas cerca de 20 marcas concentrem investimentos mais relevantes nas RMNs do varejo alimentar.
É necessário um shift cultural. As marcas precisam evoluir do mindset centrado em sell-out puro para uma abordagem baseada em impacto na jornada do shopper, com campanhas orientadas por dados, construídas a partir de objetivos estratégicos de marca.
Instore media: uma alavanca emergente
O crescimento do in-store media — sobretudo no varejo alimentar (supermercados, hipermercados e atacarejo) — mostra o desejo do mercado por presença física com tecnologia. Painéis digitais, rádios internas programáticas e ativações nos pontos de venda estão ganhando protagonismo. No entanto, a falta de integração entre instore, digital e dados de shopper ainda limita o verdadeiro impacto dessas iniciativas. É preciso que o in-store media se conecte aos dados transacionais, de fidelidade e comportamento para gerar relevância e retorno real.
Omnichannel e evolução da carteira de clientes
O varejo regional brasileiro enfrenta dificuldades em criar uma carteira ativa e fidelizada no omnichannel. Muitos ainda não estruturaram programas de CRM sólidos, tampouco mecanismos de identificação consistentes nos canais físicos e digitais. Essa lacuna compromete a personalização e dificulta a construção de campanhas baseadas em perfis e clusters de shopper. Sem dados confiáveis, as decisões ainda são tomadas com base em suposições — o que limita performance e inteligência.

A política comercial precisa evoluir com foco em shoppability
Hoje, grande parte das estratégias comerciais de Retail Media ainda se concentram no produto (SKU) e não no shopper. Para amadurecer o modelo, é essencial unir categorias, shopper insights, marketing e inteligência na construção das propostas; criar modelos comerciais focados em audiências, jornadas e ocasiões de consumo; estabelecer alavancas de campanha personalizadas por tipo de mídia e perfil de consumidor; posicionar o Retail Media como ferramenta estratégica de construção de marca e não apenas como canal de performance.
O futuro: quando amadurece a monetização da jornada do shopper?
A política de monetização orientada à jornada e inteligência do shopper só vai amadurecer quando três movimentos ocorrerem simultaneamente:profissionalização interna dos varejistas, com squads multidisciplinares e visão full funnel; maturidade das marcas CPG, com lideranças orientadas a dados e estratégias integradas com varejo; infraestrutura tecnológica consolidada, com CDPs, adservers, DMPs e mecanismos de mensuração de campanha conectados ao sell-out. Esse amadurecimento tende a ocorrer de forma mais acelerada a partir do momento em que os varejistas perceberem o Retail Media como uma nova unidade de negócio — e não apenas como uma extensão do trade marketing.
O Retail Media no Brasil tem enorme potencial — mas ainda esbarra em uma série de desafios estruturais, culturais e tecnológicos. Para destravar o crescimento e atingir um novo patamar de maturidade, é preciso evoluir da operação tática para a estratégia integrada, da visão centrada em produto para a centrada no shopper, e da gestão manual para a automatizada, com dados no centro da tomada de decisão.
A boa notícia? O caminho está traçado. Resta agora que varejistas e marcas tenham coragem, visão e capacidade de execução para acelerar essa transformação. É necessário estabelecer reflexão de sua operação atual e autoavaliação mais crítica, as lideranças precisam estabelecer plano a partir de pilares e critérios técnicos de avaliação do plano estratégico, suas ambições de receita e ganhos de mercado, além de garantir time multidisciplinar que possam entregar resultados de um guarda-chuva estratégico, proposta real de valor da mídia de varejo.